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A subida na árvore: cinco décadas de um símbolo da luta ecológica

Agapan

Ato promovido pela Agapan será no dia 25 de abril com a presença de Carlos Dayrell


Há 50 anos, um gesto ousado e corajoso transformou-se em um marco da luta ambiental no Brasil e no mundo. A subida em uma árvore em frente à Faculdade de Direito da Ufrgs, em Porto Alegre, no dia 25 de fevereiro de 1975, impedindo que ela e outras, da espécie Tipuana, fossem derrubadas para a construção de uma via elevada, fez, na época, o prefeito Telmo Tompson Flores voltar atrás e preservar essas árvores, que resistem, ainda em 2025, ao trânsito intenso e à poluição em uma das vias mais movimentadas da capital gaúcha, que é a avenida João Pessoa, junto ao Viaduto Imperatriz Leopoldina, bem no centro de Porto Alegre.


Participante de reuniões da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), onde acompanhava as discussões sobre as obras na via, o estudante de Engenharia Mecânica da Ufrgs Carlos Alberto Dayrell, que mais tarde cursou Agronomia, não teve dúvidas em pegar uma escada emprestada de um gari e subir na Tipuana, impedindo o corte. Também subiram na árvore Marcos Saraçol, seu colega de moradia na Casa do Estudante, e a também universitária Teresa Jardim. Esse gesto quase impensado rendeu a solidariedade de quem acompanhou o ato e a repercussão dada pela mídia em escala global tornou aquele momento um símbolo de resistência e de uma nova consciência ambiental.


Francisco Milanez, conselheiro e ex-presidente da Agapan, na época estudante de Engenharia Civil, recorda que o prefeito mandou cortar as árvores na época das férias, para evitar os estudantes, mas ocorreu num dia de matrícula, que era presencial. “O Dayrell, quando viu, já tinham derrubado umas três árvores. Ele pegou uma escada emprestada, porque era alto o primeiro galho, e subiu. O Saraçol e a Teresa subiram em momentos diferentes, para apoiá-lo. Depois de dialogar e negociar a preservação das árvores com o prefeito e o secretário, eles desceram e todos fomos fichados no Dops”, diz Milanez, ao citar que os ambientalistas da Agapan Caio Lustosa, José Lutzemberger e Augusto Carneiro acompanharam as negociações, inclusive com os militares, para não prenderem os estudantes.


“A grande mudança aconteceu com esse ato, em fevereiro de 75, de subida na árvore. De 71 a 75 nós estávamos diariamente nos jornais, porque não tinha censura nenhuma para nós. Mas a partir de 1975 o meio ambiente passou a ser considerado um movimento subversivo. Claro que isso não foi imediato, mas evoluiu, e depois veio a censura comercial ao meio ambiente, essa sim muito mais refinada”, avalia Milanez, ao considerar a subida na árvore um marco importante porque, de um lado, foi amplamente divulgada na mídia brasileira e estrangeira, como a Revista Times e outros veículos, marcando então a explosão do movimento ambientalista no Brasil. “Recebíamos muitas cartas com pedidos de estatutos, etc, e passaram a surgir muitas entidades ambientalistas pelo Brasil, gerando essa grande mudança, a partir de um momento histórico importante”, ressalta o ambientalista.


Impactos pessoais


Celso Marques, também ex-presidente e atual conselheiro da Agapan, não presenciou a subida, mas conta que em conversas posteriores, recebeu do protagonista da manifestação, Carlos Alberto Dayrell, uma pasta com recortes de jornais, como o The New York Times, que repercutiram esse primeiro gesto de defesa da natureza e das árvores daquela época no mundo. “Realmente, foi um gesto histórico, que teve uma repercussão muito grande e adquiriu um caráter simbólico da própria luta ecológica”, avalia. Segundo ele, esse evento suscita toda uma série de reflexões sobre a questão ecológica, cujo debate era novo e ainda inusitado para a coletividade em geral, mas era época de ditadura militar e esse gesto teve um impacto não apenas na sociedade, no movimento ecológico, se constituindo como um símbolo do movimento ecológico, “mas impactou na vida pessoal do Dayrell, que se dedicou à questão ecológica como um valor fundamental da sua própria vida e das suas opções de trabalho e de estudo”, reflete Marques.


“Enfim, a árvore que ia ser derrubada está lá até hoje e o Viaduto Imperatriz Leopoldina foi construído, indicando que a derrubada da árvore era completamente desnecessária”, ressalta Celso Marques. Segundo ele, que também é filósofo e praticando do zen budismo há mais de 50 anos, “somos uma civilização e uma cultura contra a vida, somos ecocidas, etnocidas e suicidas. Se tivéssemos atitudes voltadas para a coletividade, teríamos produzido uma civilização viável. Então está lá a árvore, a tipuana, e isso prova que o gesto do Dayrell evidenciou uma atitude de coragem fantástica, de ter desafiado a maneira de pensar habitual, não apenas da própria ditadura militar da época, mas de toda a nossa sociedade”. Para o ambientalista, “devemos preservar a memória desse gesto como um exemplar de um valor simbólico imenso para a defesa da natureza e a nossa própria sobrevivência como espécie, que hoje está ameaçada por nós mesmos, pela nossa própria atitude diante da natureza”.

Para Francisco Milanez, o ambientalismo se faz com as mãos, com a presença. “A virtualidade é uma distorção anti ambiental, é um outro mundo que não é o mundo do ambiente, é o mundo do ambiente virtual e, por isso, tem muito pouco poder. Eu acho que a gente tem que evoluir e tem que dominar, porque o poder econômico tá sendo muito mais rápido, muito mais eficaz em dominar as inovações, as redes sociais, tudo. E a gente tem que aprender um jeito de sensibilizar verdadeiramente os jovens, porque os jovens estão sensíveis na teoria, no mundo artificial, mas eles têm medo de moscas. Moscas podem transmitir doenças, aranhas podem não sei o que, cobras não sei o quê. Ou seja, eles têm medo de tudo e esse medo é o que afasta o homem da natureza. O que aproxima é o conhecimento. Então é esse o desafio atual”, conclui o ambientalista.


Subversões e ameaças


Em plena ditadura militar, o ato de subida na árvore era visto como subversão, representando o surgimento de um novo movimento, o ambientalismo, que não só questionava as práticas destrutivas de um modelo de desenvolvimento industrial, mas também impunha uma reflexão profunda sobre a ética do consumo e o impacto das ações humanas no ambiente. A causa ecológica, na época, se ligava a um contexto político mais amplo, onde a agressão à natureza era vista como parte das opressões vividas em um período de ditaduras militares e da Guerra Fria. A luta por liberdade se estendia também à necessidade de resgatar o equilíbrio com o mundo natural.

Hoje, as questões ambientais são mais complexas do que nunca. A revolução biológica e os avanços da biotecnologia, os organismos transgênicos, o patenteamento da vida e as novas dinâmicas econômicas relacionadas a essas áreas apresentam desafios que ainda estão longe de serem compreendidos pela maioria da população. O atual sistema econômico, por mais que adote algumas mudanças, ainda não reflete a verdadeira necessidade de repensar a relação com o ambiente.

Preservar a biodiversidade é essencial para a manutenção da vida no Planeta. Esse segue sendo um grande desafio.

Por isso, após essas cinco décadas do gesto de Dayrell, Saraçol e Teresa Jardim, a chamada Subida da Árvore continua a ser um símbolo de resistência e coragem, confirmando o compromisso com a vida.


Dayrell em Porto Alegre e camiseta comemorativa


O presidente da Agapan, Heverton Lacerda, ressalta que o ato de 1975 é muito importante porque representa um dos símbolos vivos da resistência ecológica promovida pela Agapan desde 1971 até os dias de hoje, com atuação ininterrupta e 100% voluntária. “Por isso, não poderíamos deixar de trazer a Porto Alegre o Dayrell para comemorar conosco em um ato que a Agapan está organizando para o dia 25 de abril, antevéspera de seu aniversário de 54 anos”, afirma Lacerda. Ele explica que manter vivo na memória da população esse gesto de proteção ambiental “é uma tarefa que a nossa entidade carrega consigo desde 1975 e levará para as próximas gerações como um legado de esperança e fé nas conquistas da luta ambiental”. O ambientalista acrescenta que “só a consciência ecológica plena tem condições de reverter esse rumo ecocída que está sendo imposto pelo atual modelo de consumismo global”. 


O presidente da Associação informa que a camiseta em alusão aos 50 anos da subida na árvore estará disponível para aquisições na banca da Agapan na Feira de Agricultores Ecologistas (FAE) a partir do sábado 8 de março. “Queremos que todos possam participar conosco no dia 25 de abril, às 13h30 junto à tipuana, vestindo mais essa camiseta da resistência ecológica da Agapan”, convida a liderança.

Acompanhe o sítio de internet e as redes sociais da Agapan para mais detalhes sobre as atividades ambientais da entidade.



Jornalistas Adriane Bertoglio Rodrigues e Susiani Guisolfi

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